Resumo: O cotidiano, arena da vida sendo vivida, muitas vezes é considerado como rotina e passividade. Neste cotidiano, porém, como assinala Certeau (1998), encontram-se muitas artes de fazer, táticas e estratégias, práticas sutis, que se tornam ainda mais evidentes quando se fala sobre identidade. Ao contrário de muitas abordagens que tratam a identidade organizacional como central e permanente, neste trabalho ela é observada como fragmentada e transitória. Diante desta perspectiva, neste trabalho objetivei compreender de que forma as táticas e estratégias no cotidiano dos feirantes da Feira do Produtor de Maringá foram se alterando, à medida que a identidade da Feira foi mudando nesses mais de 30 anos de existência. Esta pesquisa qualitativa se valeu da observação participante, de entrevistas de história oral temática e da análise de discurso para mergulhar na história da Feira, nas memórias dos feirantes, nos discursos formadores de identidades e nas relações de poder que se tecem no cotidiano dessa organização. Verifiquei que a Feira do Produtor de Maringá não possui uma identidade única e central, mas sim uma identidade fragmentada, pois os seus diversos grupos (produtores e não produtores; técnicos e feirantes; brasileiros e não brasileiros; maiorias e minorias; grupos satisfeitos e insatisfeitos, entre outros) estão identificados de forma diferente com a organização e estes grupos se criam e se recriam no seu cotidiano. E é precisamente no cotidiano onde ocorrem as lutas para defender as posições identitárias dentro da Feira, mas estas lutas são quase todas invisíveis para os de fora da organização, pois são ofuscadas diante de uma aparente estabilidade que se impõe por diferentes instrumentos disciplinares e por diversos discursos que inibem comportamentos não congruentes com os prescritos. Deste modo, constatei no transcurso histórico da Feira, que no início os instrumentos disciplinares eram mais leves, assim, as táticas e estratégias encontravam-se mais ligadas a novos saberes, novas experiências, novas aprendizagens ligadas ao ofício dos feirantes. À medida que aumenta a formalização da Feira, e concomitantemente, seus instrumentos disciplinares, novas táticas e estratégias são criadas para driblar estes novos instrumentos de controle, assim como para amenizar a situação das identidades reprimidas, que nesse novo contexto se acentua. Desta forma, as táticas e estratégias, além de serem vistas como movimentos de resistência e pequenos protestos, podem também ser entendidos como desvios para não aceitar identidades organizacionais impostas.
Abstract: The everyday, life being lived, is often regarded as elements of routine and passivity. However, as pointed by Certeau (1998), there are many arts of doing, tactics and strategies, subtle practices that become even more evident when talking about identity. Unlike many approaches that address the organizational identity as central and permanent, in this work it has been seen as fragmented and transient. Given this perspective, my goal was to understand how the tactics and strategies in everyday life of workers at the Feira do Produtor de Maringá (Maringá Producer's Fair) were changing as the identity of the Fair changed in more than 30 years of existence. This qualitative research used as instrument a participant observation, oral history interviews and discourse analysis, to get into the history of the Fair, in the memories of the workers, in the formative discourses of identities and in the power relationships that structure the everyday life of this organization. I noticed that the Feira do Produtor de Maringá did not present a single and main identity, but instead of it is fragmented due to its various groups (producers and non-producers; technicians and workers; Brazilians and non-Brazilians; majorities and minorities; satisfied and unsatisfied groups, among others) which are differently identified with the organization and are created and recreated in its everyday life. And is precisely in everyday life where struggles happen to defend the identity positions within the fair, but these struggles are almost invisible to the viewer outside the organization, because it were overshadowed by the perceivable stability enforced by different instruments and disciplinary discourses that inhibit non congruent behaviors with the prescribed ones. Thus, I realized in the historical course of the Fair that in the beginning the disciplinary instruments were lighter, and so the tactics and strategies were also more connected to new knowledge, new experiences, new learning linked to the workers' activity. As the formalization of the fair increased and concomitantly their disciplinary tools, new tactics and strategies were created to prevent from these new instruments of control as well to ease the plight of repressed identities, which is emphasized in this new context. Thus, tactics and strategies, although being seen as resistance movements and small protests can also be understood as deviations to not accept imposed organizational identities. |